|- style="font-size: 85%;"
|
Erro:
:
valor nao especificado para "
continente
"
A
Monarquia do Norte
foi uma
contrarrevolucao
ocorrida na cidade do
Porto
, em
19 de janeiro
de
1919
, pelas juntas militares favoraveis a restauracao da
monarquia
em
Portugal
em plena
1ª Republica portuguesa
. Este breve periodo, tambem apelidado de ≪
Monarquia do Quarteirao≫,
por so ter durado 25 dias (de 19 de janeiro a 13 de fevereiro), e de ≪
Reino da Traulitania
≫
[
1
]
foi, em tracos gerais, a ultima profunda manifestacao de revolta monarquica com utilizacao da forca depois da
implantacao da Republica
em Portugal em 1910.
A partir deste efemero acontecimento, que restaurou a monarquia na cidade do Porto e por quase todo o
norte do pais
, o espirito realista parece ter adormecido, ficando restrito a pequenos grupos.
Face as transformacoes ideologicas, politicas e sociais que resultaram do
5 de outubro de 1910
, muitos monarquicos decidiram emigrar para outros paises monarquicos. Outros acabaram por ficar em Portugal, e destes, muitos acabaram por aderir ao novo regime.
Paiva Couceiro
, vendo recusado o seu pedido de se fazer um
plebiscito
para que o povo escolhesse em que regime queria viver, entregou a sua espada e em 1911 exilou-se na Galiza, planeando a partir do exilio as "incursoes monarquicas".
Quando Couceiro comeca a por em pratica aquilo que defendia, o proprio ex-rei de Portugal declara o seu desagrado e envia um comunicado em que deixa claro que nao iria apoiar uma
revolucao
de causa monarquica. A opiniao monarquica fica assim dividida, entre os partidarios do monarca que querem restaurar a monarquia pela via parlamentar e os integralistas que a querem restaurar pela forca das armas. Gracas a esta divisao, a causa monarquica foi incapaz de abalar a republica nos anos que se seguiram a sua instauracao.
A 5 de dezembro de 1917 aparece o embriao daquilo que podera ser um novo regime e, possivelmente, a restauracao da Monarquia.
Sidonio Pais
toma o poder atraves da Junta Militar Revolucionaria e a ele se juntaram monarquicos e integralistas, catolicos, republicanos presidencialistas (como
Tamagnini Barbosa
), republicanos parlamentares (como
Egas Moniz
), e machadistas (seguidores de
Machado Santos
). Desde cedo, os monarquicos comecam a aperceber-se que Sidonio nao era a esperanca restauracionista que tanto queriam acreditar. Os monarquicos mais radicais depressa deixam de ver o presidente-rei como uma esperanca e no verao de
1918
aderem as correntes revolucionarias que planeavam acabar com a
Republica Nova
.
Os monarquicos apoiados pelo ex-rei D. Manuel, com o aproximar do final da grande guerra, recebem indicacoes do proprio para apoiar o governo de Sidonio para que fosse instaurada um governo militar ou uma continuacao do governo de Sidonio, atendendo as causas monarquicas, mas os mais radicais continuavam a querer derrubar a Republica Nova. Comecam a ocorrer choques estrategicos entre outubro e dezembro, entre os monarquicos passivos e os revolucionarios, motivo que fragilizou "mortalmente" o regime de Sidonio Pais, ja totalmente dependente da vontade dos monarquicos.
O presidente da Republica
Sidonio Pais
e assassinado no dia
14 de dezembro
de
1918
. A Junta Militar do Norte faz a 18 de dezembro uma proclamacao ao pais, exigindo uma ≪intensificacao do combate a demagogia, atraves de um governo com capacidade e energia≫. Todos os regimentos do Porto concordavam com estabelecimento de um governo de forca, exigencia que a Junta do Norte fazia em tom de ameaca. Ja em Lisboa a concordancia era diferente, onde apenas o Regimento de Artilharia de Queluz e dois regimentos de cavalaria de Belem (Lanceiros 2 e Cavalaria 4) pareciam concordar com a linha de pensamento do norte.
Em 23 de dezembro, o almirante
Canto e Castro
chama
Tamagnini Barbosa
para chefiar o governo. Tamagnini depressa procurou estabelecer uma politica dubia, de compromisso em relacao a esquerda e a direita, com a intencao de apaziguar as tensoes acumuladas entre todos os sectores politicos para que se evitasse uma possivel guerra civil. No mesmo dia, nao havendo nenhum representante das juntas no governo formado, juntas militares no Norte e no Sul reivindicam um “governo de forca” que seguisse a obra do "presidente-rei", contra o retorno a "Republica Velha" da
Constituicao de 1911
. Como protesto, o coronel
Joao de Almeida
concentra em Monsanto algumas unidades da guarnicao de
Lisboa
, mas o Governo consegue rapidamente conter esta intimidacao. No
Porto
, constitui-se uma Junta Governativa Militar com a missao de dirigir os negocios publicos do norte do pais.
Tamagnini Barbosa envia ao Porto o Tenente Teofilo Duarte e mais dois emissarios para negociar com a Junta Militar do Norte. A conclusao a que as conversacoes chegaram foi a de que a Junta insistia que Tamagnini continuasse no governo como pessoa de confianca do Exercito, mas com a condicao de se libertar de qualquer influencia partidaria, sendo que para tal, a Junta exige a saida de Egas Moniz e de Afonso de Melo Pinto Veloso do governo (sidonistas republicanos). Como consequencia, o governo ha pouco constituido sofre uma remodelacao e a Junta cresce, mas esta medida nao acalmou os animos pois o novo gabinete tinha demasiadas parecencas com o anterior, era republicano mas conservador.
A 2 de janeiro, o coronel Silva Ramos (figura de destaque da Junta Militar do Norte) vai a Lisboa para se encontrar com o Presidente da Republica e sai de la convencido de que o governo ouvira a vontade da Junta.
A
3 de janeiro
de
1919
o governo, na realidade nao estando disposto a ceder as vontades da Junta Militar do Norte, entrega o comando da Divisao Militar de Vila Real ao republicano coronel Ribeiro de Carvalho, com o objetivo de fazer frente as exigencias da Junta. Esta, sentindo-se enganada, envia uma coluna militar chefiada pelo major Alberto Margaride contra a Divisao de Vila Real, enquanto se proclama herdeira e representante da heranca
sidonista
.
Tres dias depois, a 6 de janeiro, houve um breve confronto que terminou prematuramente quando Tamagnini Barbosa, vendo a possibilidade do inicio de uma guerra civil, decide ceder a algumas exigencias da Junta Militar do Norte. No mesmo dia, chega-se a um acordo para a constituicao de um novo governo. Silva Bastos entra para a pasta da Guerra, Francisco Fernandes (deputado da minoria monarquica) e colocado na Justica no lugar que pertencia Afonso de Melo em para a do Trabalho, o capitao Eurico Cameira, militar muito querido das juntas pela sua fidelidade ao falecido presidente-rei. Contudo, Egas Moniz permaneceu no governo. Assim, portanto, satisfeita a Junta Militar do Norte, o ataque ao governo iria iniciar-se a partir dos republicanos.
Em 8 de janeiro, Tamagnini Barbosa apresenta novo gabinete perante as Camaras. Em defesa da "
Republica Velha
",
Cunha Leal
, no Parlamento, e
Machado Santos
, no
Senado
, acusam o chefe do governo de cedencias as Juntas Militares.
Secundando estas acusacoes, Alvaro de Castro, Couceiro da Costa e Antonio Granjo (evolucionistas), Jaime de Morais e Cunha Leal (republicanos e anti-dezembristas) e Augusto Dias da Silva (socialista), em representacao de varios padroes politicos, fazem eclodir uma revolta militar com o apoio de guarnicoes militares de Abrantes, Santarem, Caldas da Rainha e Tomar, favoravel a Constituicao de 1911. Havendo luz verde do governo, que procurava livrar-se da latente ameaca monarquico-reacionaria das juntas militares, a resolva e posta em andamento.
No dia 12 de janeiro, quase simultaneamente em
Lisboa
,
Covilha
e
Santarem
. Na capital, civis comandados por alguns oficiais do Exercito entram no Castelo de S. Jorge para conseguir o apoio das tropas de Infantaria e Artilharia que ali se encontravam, porem, o tenente-coronel Schiappa de Azevedo nao aceitou pactuar com tal revolta e ocorreu a tropa de alguns tiros, provocando o falhanco dos propositos dos revoltosos. Tambem no Arsenal da Marinha em Lisboa, civis e cerca de 300 marinheiros, orientados pelo tenente Prestes Salgueiro (ministro da marinha demitido), tentaram a sua sorte, acabando tambem no fracasso. No dia 13, Lisboa e vencida. Na Covilha os revoltosos foram tambem rapidamente dominados, perante a ameaca das tropas das guarnicoes de Castelo Branco e da Guarda.
Diferente fim so deve a revolta em Santarem, que contou com chefes politicos categorizados como o coronel Jaime de Figueiredo, o coronel Ramos de Miranda e o capitao Triboulet, apoiados por um numero avultado de tropas. A partir desta forca, pediram ao presidente da Republica a demissao de Tamagnini Barbosa e a formacao de um “governo de concentracao republicana”, onde ficassem representados os partidos da “Republica Velha”.
Com a reacao dos partidos da "Republica Velha" a ganhar expressao militar em Santarem, os monarquicos do
Integralismo Lusitano
, que haviam apoiado o Sidonismo, resolvem agir. Enquanto no sul ainda predominavam os republicanos sidonistas, no norte do pais era nitido o predominio dos monarquicos.
As Juntas Militares, que haviam sido criadas com o proposito de impedir o retorno ao regime dos partidos da "Republica Velha", teriam agora de aderir ao proposito restauracionista. O Governo ainda tera chegado a discutir a possibilidade de substituir alguns comandos na capital, mas logo que e dada como falhada a tentativa de constituicao de um governo militar em Lisboa,
Hipolito Raposo
redige, em 14 de janeiro, com
Rui da Camara
e
Jose de Avelar Frois
, um memorando em que o
Lugar-Tenente
de
D. Manuel II
, conselheiro
Aires de Ornelas
, vem a escrever a expressao inglesa ≪go on!≫ que o rei lhe dera um dia para, em certas condicoes, se poder levantar em Portugal a
bandeira da Monarquia
.
Os revoltosos de Santarem depoem as armas no dia 15, perante o
tenente Teofilo Duarte
, mas o papel que Hipolito Raposo apresentou na vespera a
Aires de Ornelas
dizia o seguinte:
“
|
MEMORANDO
- 1º Sobre a possibilidade do assentimento de V. Ex.a para um movimento militar de caracter monarquico.
- 2º Sobre o assentimento de V. Ex.a para um movimento militar, promovido por oficiais monarquicos e republicanos, para propor ao Pais a formula do plebiscito sobre o regime politico.
- 3º Qual seja a opiniao de V. Ex.a, em qualquer das hipoteses, sobre o perigo de uma intervencao estrangeira, obstaculo que nao deteve os democraticos para a organizacao e execucao do actual movimento revolucionario.
- 4º Sobre a opiniao de V. Ex.a em caso de vitoria, acerca do reconhecimento pelas nacoes estrangeiras da nova ordem de coisas politicos, levando em conta a acao diplomatica de El-Rei e dos seus amigos junto do governo ingles e o seu notavel prestigio junto dos outros governos aliados.
- 5º No caso do seu assentimento, indicacao dos nomes que na opiniao de V. Ex.a devem constituir a Junta do Governo Nacional, em nome de El-Rei.
- 6º Sem que tal facto importe menos credito a palavra de V. Ex. e a seriedade do portador, seria conveniente que as opinioes a expor fossem dadas por escrito, para assim lhes ser atribuido todo o valor que merecem pelos elementos de acao que precisam de ser consultados”.
|
”
|
Aires de Ornelas escreveu a margem do documento:
“
|
Go on! Palavras d’El-Rei
Nao vejo razao para plebiscito
Nao julgo dificil o reconhecimento
Aires de Ornelas
14 Jan. 1919
|
”
|
No dia seguinte, 15 de janeiro, o governo de Tamagnini toma posse e, em 17, nos termos da Constituicao de 1911, o Congresso elege o almirante Canto e Castro presidente da Republica. Ou seja, liquidado Sidonio Pais em 14 de dezembro, cerca de um mes bastara para que os sidonistas de Lisboa deitassem por terra o regime presidencialista esbocado na “Republica Nova”.
Enquanto em Lisboa, sidonistas de vespera, democraticos, unionistas, e socialistas, se iam unindo ao governo de Tamagnini Barbosa, Paiva Couceiro seguiu para o Porto onde o terreno era mais propicio a restauracao da Monarquia.
A Junta Central do Integralismo Lusitano reuniu-se no dia 17 a noite, tomando-se a decisao de
Antonio Sardinha
e
Luis de Almeida Braga
seguirem para o Porto com a missao de “procurar suster o pronunciamento, ate se ultimarem as ligacoes que viriam dar-lhe maior caracter de unanimidade em Lisboa e na Provincia”.
Antonio Sardinha chegou ao Porto na manha do dia 18, mas a Monarquia foi proclamada logo no dia seguinte, 19 de janeiro, apos uma parada militar, hasteando-se a bandeira portuguesa do tempo da Monarquia (Azul e Branca) e cantando-se o hino da
Carta Constitucional
.
A restauracao declarou em vigor a Carta e indicou como chefes,
Luis Cipriano Coelho de Magalhaes
,
Antonio Adalberto Sollari Allegro
,
Pedro de Barbosa Falcao de Azevedo e Bourbon
(
Conde de Azevedo
), Dr.
Julio Girao Faria de Morais Sarmento
(
Visconde do Banho
) e Coronel engenheiro
Artur da Silva Ramos
. A Junta Governativa do Reino, junto ao Governo Civil do Porto, ficou sob o comando de
Henrique Mitchell de Paiva Couceiro
. Com a excecao de
Chaves
, no norte do pais todos as cidades aderiram ao movimento de restauracao da Monarquia. Nao sem perseguicoes politicas. O administrador do concelho de Vila Real, ja dos tempos da Monarquia
[
2
]
, o jurista
[
3
]
Antonio Ferreira da Costa Agarez, entretanto um dos apoios locais da Primeira Republica, tambem conhecida por Republica Velha, foi perseguido sob risco de atentado a sua vida, escapou da morte durante a noite, refugiando-se na freguesia vizinha periurbana de Parada de Cunhos, mas ja num lugar ermo da Serra do Marao, onde permaneceu por semanas; existindo mesmo nesta freguesia o infame Monte da Forca, onde se esperava serem sentenciados a morte, por execucao sumaria caso nao fugissem e se munissem de armas para se defenderem da perseguicao dos partidarios monarquicos, os responsaveis politicos republicanos, durante o momento de especial fervor contra-revolucionario vivido contra aqueles que tivessem servido durante o periodo da Monarquia e aderido ao ideal republicano.
Em
Lisboa
, uma parte de Junta Militar teve tambem a intencao de seguir o movimento do norte. Nao havia porem unanimidade: uma parte era a favor, mas havia outra parte que se mantinha neutra. Na manha do dia seguinte a proclamacao do Porto, Hipolito Raposo suspendeu o jornal ''
A Monarquia
'', seguindo para o Regimento de Cavalaria 2, em
Belem
, onde se estavam a concentrar os monarquicos. O plano era o de ir a Monsanto tomar o posto de T.S.F. para estabelecer contacto com o Norte e coordenar as acoes militares a desenvolver. Numa ultima tentativa de apaziguar a tempestade que se avistava a norte, Tamagnini Barbosa envia o ministro da Guerra,
Silva Bastos
, ao norte e tenta ainda um golpe politico ao substituir o governador civil do Porto pelo capitao-tenente
Antonio Pais
(irmao de Sidonio Pais) e nomeando comissario-geral de Policia o tenente-coronel
Cristovao Aires
(acabando assim com Sollari Allegro). Entretanto, no Porto, a Junta Governativa do Reino nomeia Antonio Sardinha
governador civil
de
Portalegre
, com o intuito de ai se vir a proclamar a Monarquia. Sardinha fica no entanto retido pela missao prioritaria de constituir o Gabinete da Presidencia do Governo, agregando
Luis de Almeida Braga
,
Joao do Amaral
e
Nosolini Leao
.
No dia 19 chegam ao Porto Cristovao Aires e Antonio Pais que se juntam a Silva Bastos. Decidiu-se dar conhecimento a Silva Bastos de que no proprio dia 19 seria proclamada a Monarquia e foram todos aconselhados a sair dali o mais rapidamente possivel, porem sem antes assinarem um documento onde se comprometiam a nao tentar nada contra o movimento monarquico ate chegarem a Lisboa.
A
19 de janeiro
de
1919
, num domingo concentravam-se no
Monte Pedral
, pela uma hora da tarde, os contingentes de todos os corpos da guarnicao e da Guarda. Aparentemente parecia mais uma
parada militar
, mas nao era. Ali encontravam-se reunidas as forcas militares, contingentes de Infantaria 6 e 18, de Cavalaria 9, de Artilharia 5 e 6, do grupo de metralhadoras, da Policia e da
Guarda Republicana
, e ainda um pelotao de Cavalaria 11 de
Braga
, para alem de outras tropas.
Pouco depois chegou em automovel
Paiva Couceiro
, envergando o seu uniforme de oficial de Artilharia, e, montando a cavalo, surge no meio do quadrado formado pelas tropas, acompanhado por alguns oficiais galegos. As populacoes civis que presenciavam isto ficaram impressionadas com a aparente determinacao das forcas em desfile. Quem nao estava impressionado depressa ficou, quando o alferes
Calainho de Azevedo
, de Cavalaria 9, desfralda a bandeira azul e branca.
Paiva Couceiro faz entao uma declaracao, onde proclamou que o
Exercito
e, acima de tudo, a mais alta expressao da Patria, e por isso tem que guarda-la nas circunstancias mais dificeis, acudindo na hora propria contra os perigos, sejam eles externos ou internos, que lhe ameacem a existencia. Apos o discurso, e levantada a bandeira monarquica e a banda da Guarda toca o
Hino da Carta
. De seguida, Couceiro faz uma revista as tropas e estas desfilam em continencia.
E assim declarada a restaurada Monarquia a uma e meia da tarde de 19 de janeiro, pelas forcas da guarnicao militar do Porto, no largo Monte Pedral, em nome de
Sua Majestade D. Manuel II
.
No norte, e principalmente no Porto, a populacao estava em festa. O povo saiu a rua, soltando vivas a Portugal, ao rei e a Monarquia. Tiros de salva de artilharia eram disparados a partir da
Serra do Pilar
. Ocorre um desfile das tropas pelas ruas da
Invicta
ate ao quartel-general onde estava o Governo Civil, junto a
Praca da Batalha
. Segundo relatos da epoca, eram tantas as pessoas nas ruas que o automovel onde seguia Paiva Couceiro com dificuldades seguiu ate ao quartel-general.
As tres da tarde do mesmo dia 19 e lida por
Baldaque de Guimaraes
a nova proclamacao, enumerando as causas e os objetivos da contrarrevolucao, e quem seriam os homens que iriam resgatar a Patria da calamidade em que se encontrava. Lida a proclamacao, a banda da Guarda volta a tocar o Hino da Carta ao mesmo tempo que se ouvem 21 tiros de salva. No final, e icada a bandeira azul e branca no quartel-general, seguindo-se as comemoracoes populares espalhadas por toda a cidade. Por todo o Norte o dia ficou marcado pelo hastear da bandeiras monarquicas e sinos a tocar, e com o encerramento de muitos servicos publicos no dia 20 de janeiro. No seu lado mais sombrio, bandeiras republicanas foram queimadas e diversos democratas e republicanos foram presos nas suas terras.
Os primeiros dias da Monarquia do Norte terao sido tranquilos, malgrada a perseguicao politica daqueles que tinham aderido a causa republicana, como e o caso do entao Administrador do Concelho de Vila Real ja antes da Revolucao Republicana, Antonio Ferreira da Costa Agarez, insigne politico e jurista vila-realense, que a altas horas da madrugada teve de se refugiar na Serra do Marao para nao ser morto, onde permaneceu ate ao fim da contra-revolucao. Mas sem noticias do Sul, ate que
Antonio Teles de Vasconcelos
conseguiu montar os servicos de comunicacoes ao longo da fronteira.
Antonio Sardinha
foi entao destacado para
Badajoz
,
Luis Teles de Vasconcelos
(irmao de Antonio) para
Caceres
,
Joaquim de Almeida Braga
para
Tui
, de onde planeavam penetrar em Portugal com propositos restauracionistas. Foram presos pelas autoridades da Monarquia espanhola, antes de conseguirem voltar a entrar em Portugal. Estes primeiros dias faziam lembrar o 5 de outubro nove anos antes, em que nao foi encontrada grande resistencia para implantar a republica, sendo que a populacao nao tinha preferencias por um regime ou por outro, e o mesmo se voltava a passar. Embora muita gente saisse a rua e festejasse, ainda havia uma grande camada da chamada "classe pobre" que nao estava interessada no regime, mas sim se teria pao para comer na manha seguinte.
A
Junta Governativa do Reino
, sediada no Porto para organizar o novo regime monarquico, aproveita o corte de comunicacoes com Lisboa e aproveita para disseminar na populacao a noticia falsa de que a monarquia se impusera por todo o pais e que nao haveria volta a dar.
Os chefes da causa monarquia, demasiado confiantes no decorrer da proclamacao da monarquia no norte do pais, nao se decidiam no que fazer ou no que decidir em relacao a capital. Esta indecisao, que se prolongou durante alguns dias, foi um dos erros que levou a Monarquia do Norte ao fracasso, pois deu tempo aos republicanos a sul e na capital de se reorganizarem e prepararem uma defesa/contra-ataque.
A revolta em Lisboa so eclodiu no dia
22 de janeiro
, sob o comando de
Aires de Ornelas
, apoiado pelo
tenente-coronel
Alvaro de Mendonca
. Um grupo de cerca de setenta militares e civis monarquicos, chefiados pelo capitao
Julio da Costa Pinto
, sobem entao para o
Forte de Monsanto
, onde hasteiam a bandeira da monarquia e estabelecem contacto com o norte. Vem a ficar cercados pelos
republicanos
em
24 de janeiro
. Enquanto uns 30
monarquicos
sairam da
Cruz das Oliveiras
em direcao a
Ajuda
, para ir sublevar o quartel de Infantaria 16, os que ficaram em Monsanto nao foram suficientes para suster as forcas republicanas que ali se concentraram. Os monarquicos, em desvantagem numerica, lutaram ate ao fim da tarde, mas o capitao Julio da Costa Pinto, com alguns feridos graves sob o seu comando - entre os quais
Pequito Rebelo
e
Alberto Monsaraz
- , acabou preferindo a capitulacao a fuga.
O governo, sentindo-se desprovido de forca para enfrentar as forcas que a norte haviam instaurado uma monarquia, espalha a noticia que se soltariam dos presidios as legioes de republicanos civis e militares e fez publicar nos jornais da manha um convite a populacao da capital intitulado "As armas cidadaos". Ai se apelava a todos os adeptos do regime do 5 de outubro a comparecerem no
Campo Pequeno
para que se constituissem batalhoes aos quais seriam distribuidos armas. Receberiam entao uma breve instrucao e seriam comandados pelo coronel
Mineiro de Almeida
, pelo major
Andre Brun
e pelo capitao
Urosa Gomes
, apoiados por sargentos e cabos. Ate apelou-se aos estudantes para criarem um batalhao academico. Oradores improvisados iam de rua em rua para espalhar discursos inflamados para conseguir o apoio da populacao.
Na noite de 22 de janeiro, os monarquicos finalmente decidem apoiar publicamente as pequenas forcas monarquicas da capital. Centenas de monarquicos, liderados pelo tenente
Julio da Costa Pinto
, foram recolher-se a
Lanceiros 2
e aos quarteis de
Cavalaria 2 e 4
, em
Belem
, receando pelas suas vidas um ataque em forca por parte das forcas republicanas. Assim, tropas da guarnicao de Lisboa, receando o regresso da
anarquia
demagogica
dos republicanos, as ordens de
Aires de Ornelas
e
Joao de Azevedo Coutinho
e sob chefia militar de Alvaro de Mendonca proclamaram o seu apoio a restauracao monarquica do Norte e sairam para posicoes defensivas no estrategico
Forte de Monsanto
, em manifesta atitude hostil a Republica, iniciando assim a chamada "escalada de Monsanto".
Assim que chegam a
serra de Monsanto
, os dissidentes monarquicos acampam na
Cruz das Oliveiras
, onde improvisam um quartel-general. Receando o regresso da demagogia republicana mas tambem sem grandes intencoes de se sacrificarem pela causa monarquica, o objetivo primario deste conjunto era o de se defender dos republicanos, visto que os quarteis nao ofereciam defesa suficiente.
Foi preciso que soassem os primeiros tiros dos republicanos para que as tropas com inclinacao monarquica, cedendo a pressao dos que realmente estavam ali para morrer pela monarquia, consentissem o hastear da bandeira azul e branca no alto da serra e comecassem a lancar
granadas
para diversos pontos da cidade, intimidando o Governo a rendicao. Porem, era tarde demais para os revoltosos.
Reagindo apenas quatro dias depois dos acontecimentos a Norte, a rebeliao em Lisboa durou apenas dois dias.
As operacoes que envolveram ambas as partes tiveram, por assim dizer, duas fases. A primeira foi de 19 de janeiro, quando se iniciou a revolta, e teve o seu fim no dia 31 de janeiro, quando os republicanos terminaram de mobilizar as suas forcas e estabeleceram uma cobertura ao longo do rio Mondego.
A segunda fase ocorreu entre 1 e 20 de fevereiro, fase na qual se levam a cabo as operacoes de neutralizacao da revolta monarquica.
A 20 de janeiro o tenente-coronel Silva Bastos, ministro da Guerra, ao regressar do Porto, ordena que sejam tomadas algumas providencias, entre elas:
- Constituir um quartel-general que funcionaria junto do Ministerio da Guerra
- Mobilizar as unidades da 1ª e da 4ª divisoes do Exercito
- Organizar a cobertura nos Vales do Vouga e do Mondego pelas 2ª, 5ª e 7ª divisoes do Exercito
- Resolver as situacoes revoltosas da 3ª e da 8ª divisoes
- Apurar se havia ainda republicanos na 6ª Divisao (de Vila Real)
- Se o resultado do ponto 5 fosse positivo, levar auxilio aos republicanos da 6ª Divisao, procurando "limpar" a margem sul do Douro
Coimbra tornou-se uma cidade importante, com ambas as partes a terem a nocao de que, a forca que chegaria primeiro a cidade dos estudantes, ganharia vantagem sob o adversario. As dificuldades que se apresentavam para as forcas republicanas eram de ordem tecnica, havendo uma extraordinaria falta de material e havendo todo um complexo problema em que as nomeacoes tinham que ser feitas nao com base no posto mas com base na ideologia de cada um.
Entretanto dera-se o acontecimento de Monsanto, o que fez com que as tropas republicanas recuassem de volta para a capital. No dia 26, o ministro de Guerra Silva Bastos assinava um decreto onde nomeava o general Alberto Mimoso da Costa Ilharco como comandante das forcas em operacoes.
Ordenou-se entao a marcha de todas as unidades e, no dia 29 de janeiro, assume o cargo de Chefe do Estado-Maior o coronel Roberto da Cunha Baptista.
Fevereiro e o mes em que se inicia a ofensiva, fazendo as forcas republicanas uma marcha em direcao ao Norte, onde em todas as cidades por onde passavam, os revoltosos ou fugiam ou se rendiam.
No dia 1 de fevereiro, o tenente Teofilo Duarte, que se preparava para lutar do lado republicano, decide revoltar-se.
No dia 10 e emitido um decreto do Governo da Republica onde se autorizava a composicao de unidades formadas por voluntarios civis, havendo centenas de civis que voluntariamente se oferecam para cooperar com as forcas do Exercito. Estas forcas civis organizaram-se em batalhoes ou companhias de Voluntarios Civis, que ganharam um bracal verde com as iniciais VR (Voluntarios da Republica) e VA (Voluntarios Academicos). A estas forcas seriam distribuidas armas e algum treino militar, e os jovens voluntarios academicos nao iriam sofrer qualquer falta no seu ano academico devido ao seu servico aos republicanos.
No norte, no Porto, a revolta so terminou a
13 de fevereiro
. Neste dia, apos combates em todo o litoral centro, nomeadamente em
Angeja
, a guerra civil termina com a entrada dos exercitos republicanos no Porto.
Apos a falhada Monarquia do Norte, algumas centenas de oficiais do Exercito foram sumariamente afastados do servico ou demitidos, voltando o
Partido Democratico
de
Afonso Costa
a dominar a situacao politica da "Republica Velha" praticamente ate ao
28 de maio
de
1926
.
Entre os monarquicos, o desfazer da Monarquia do Norte criou imediatamente divisoes no campo dos apoiantes de D. Manuel II. Apesar do expresso apoio ao movimento restauracionista do Lugar-tenente, Aires de Ornelas, alguns monarquicos alegaram que a revolta teria sido feita a revelia do Rei
Dom Manuel II
, que se encontrava no
exilio
, em
Inglaterra
. O Integralismo Lusitano enviou uma sua delegacao a
Londres
conferenciar com o Rei, para fazer um balanco da situacao e estudar as vias de acao futura. Apos varias entrevistas, desiludidos com as respostas que obtiveram do Rei, os integralistas decidem afastar-se da sua obediencia, vindo a juntar-se a
Causa Legitimista
no reconhecimento conjunto de
D. Duarte Nuno de Braganca
, neto do rei
D. Miguel I
. Esta divisao do campo monarquico so viria a ser debelada na sequencia da morte de D. Manuel II, em
1932
e do suposto
Pacto de Dover
, quando todos os organismos monarquicos fizeram o reconhecimento de D. Duarte Nuno de Braganca como o herdeiro do trono de Portugal.
Referencias
- Diario da Junta Governativa do Reino de Portugal
. Coleccao Completa, nº 1 (19 Jan 1919) ? nº 16 (13 Fev 1919), Porto, J. Pereira da Silva, 1919.
- Felix Correia,
A Jornada de Monsanto ? Um Holocausto Tragico
, Lisboa, Tip. Soares & Guedes, Abril de 1919.
- A Questao Dinastica ? Documentos para a Historia mandados coligir e publicar pela Junta Central do Integralismo Lusitano
, Lisboa, Empresa Nacional de Industrias Graficas, 1921.
- Luis de Magalhaes, “Porque restauramos a Carta em 1919”,
Correio da Manha
, 27 e 28 de Fevereiro de 1924.
- Luis de Magalhaes,
Perante o Tribunal e a Nacao
, Coimbra, 1925.
- Hipolito Raposo,
Folhas do meu Cadastro, Volume I (1911-1925)
, Edicoes Gama, 1940.
- Antonio Sardinha, "Conrado nao guarda silencio!" em Antonio Rodrigues Cavalheiro,
Um Inedito de Antonio Sardinha sobre a Monarquia do Norte
, Separata do nº 15-16 da revista Sulco (2ª Serie), Lisboa, 1968, pp. 43-55.
- Redaccao Quidnovi, com coordenacao de
Jose Hermano Saraiva
,
Historia de Portugal, Dicionario de Personalidades
, Volume VIII, Ed. QN-Edicao e Conteudos,S.A., 2004
- Paiva Couceiro e a contra-revolucao monarquica (1910-1919), por Artur Ferreira Coimbra, Mestrado em Historia das Instituicoes e da Cultura Moderna e Contemporanea, Universidade do Minho, Braga, 2000
- A contra-revolucao na I Republica 1910-1919 (versao parcial), Miguel A Dias Santos, Imprensa da Universidade de Coimbra
- Sem rei nem roque? Os 100 anos da Monarquia do Norte, por Rui Ramos, Observador,19 Janeiro 2019
- Monarquia do Norte: A revolta em que os monarquicos perderam de vez, Observador, 17/1/2019
- Jose Manuel Quintas, "Os combates pela bandeira azul e branca",
Historia
, nº 10, Janeiro de 1999.