Genny Gleizer
(
Hotin
,
1916
c.
?
Nova York
,
1995
c.
) foi uma
imigrante
judia
de
origem romena
, presa ainda menor de idade,
torturada
e
deportada
do
Brasil
em 12 de outubro de 1935 por meio de
decreto
do entao presidente
Getulio Vargas
, sendo acusada de supostas atividades subversivas em meio a instabilidade politica e
antissemitismo
que aconteciam no pais. Irma da
antropologa
Berta Gleizer Ribeiro
.
[
1
]
[
2
]
[
3
]
Genny e sua irma Berta foram abandonadas ainda criancas numa pequena provincia do
Leste Europeu
apos o
suicidio
da mae, pois seu pai ja se encontrava no Brasil em busca de oportunidades de trabalho devido a perseguicao
antissemita
que os
judeus
estavam sofrendo na regiao da
Bessarabia
.
[
1
]
Somente com a ajuda de uma organizacao internacional e que as duas conseguiram reencontra-lo em 1932.
[
1
]
Alguns anos depois, Genny e o pai sao presos e deportados na epoca em que o Brasil passava por intensa repressao politica aos imigrantes judeus no inicio da
ditadura Vargas
.
[
1
]
A prisao de Genny serviu como modelo para as futuras acoes repressivas do governo brasileiro,
[
4
]
a partir da reestruturacao da
policia politica
, que passava a agir baseada na
Lei de Seguranca Nacional
de 1935.
[
1
]
E, pela primeira vez no pais, registrou-se o envolvimento da populacao em prol da libertacao de um
preso politico
, sendo entao precursora das campanhas pelos
direitos humanos no Brasil
.
[
5
]
[
6
]
[
1
]
Genny Gleizer nasceu no ano de 1916 em
Hotin
(atualmente na
Ucrania
), regiao romena da
Bessarabia
.
[
2
]
Filha de Rosa Sadovinic Gleizer e Motel Gleizer. Seu pai deixou a Bessarabia em julho de 1929
imigrando
para o
Brasil
na busca por melhores condicoes de sobrevivencia, pois a situacao era precaria devido as graves restricoes que os judeus no pais vinham sofrendo com o aumento do
antissemitismo
, a ascensao de movimentos
fascistas cristaos
e tambem dos ataques
pogroms
no territorio.
[
1
]
Nao podendo mandar buscar sua familia de imediato, nem mandar-lhe o necessario para viver, Motel foi surpreendido com a noticia do suicidio de Rosa, pois ela nao suportara a vida miseravel.
[
1
]
Suas duas filhas ficaram abandonadas sem familia, sem teto e sem comida. Foi por intermedio da
Jewish Colonization Association
(JCA), uma organizacao internacional que fornecia aos judeus meios para emigrarem e tambem pela intercessao do
rabino
Raffalovich, que trouxeram as meninas para o Brasil.
[
1
]
Genny (as vezes, escrito Jenny) chega ao
Rio de Janeiro
como imigrante, aos quatorze anos de idade na companhia da irma Berta de oito anos em 1932, e sendo os tres muito
pobres, dividiam um quarto na
Rua do Riachuelo
. Seu pai trabalhava como
comerciante
nos arredores da
Praca XI
, reduto da
comunidade judaica
na epoca.
[
1
]
[
7
]
[
2
]
Um ano e meio apos sua chegada ao Brasil, Genny ja dominava a
lingua portuguesa
e tambem trabalhava, e em 1934 vai para
Sao Paulo
, passando a morar em quartos alugados, trabalhando como
tecela
em uma
fabrica de tecidos
e depois em um escritorio.
[
7
]
[
4
]
Em 11 de julho de 1935 a
Alianca Nacional Libertadora
foi proibida pelo governo brasileiro, ato que teve por base a
Lei de Seguranca Nacional
, aprovada em marco daquele mesmo ano
[
3
]
e o pais estava sob a egide da
Constituicao liberal de 1934
.
[
4
]
Nesse periodo de instabilidade politica, os imigrantes judeus passaram a ser vistos negativamente por parte de setores da elite brasileira, em aspectos relativos a
religiao
e a
economia
, alem de politico-ideologicos.
[
8
]
Praticas
antissemitas
e
xenofobas
se manifestaram: atitudes de intimidacao, perseguicao politica,
prisoes
,
torturas
e
deportacoes
, sob o pretexto ? verdadeiro ou nao ?, de praticas
comunistas
, alem da proibicao da entrada de novos imigrantes no pais.
[
3
]
[
2
]
[
8
]
Assim, "comunista" tornou-se um
estereotipo
de
senso comum
para se referir aos judeus e demais estrangeiros que viviam no Brasil.
[
1
]
[
6
]
Nesse contexto, em 15 de julho de 1935, uma expressiva reuniao de jovens, visando preparar o
I Congresso da Juventude Proletaria e Estudantil de Sao Paulo
, realizada pelo Sindicato dos Empregados do Comercio no
Palacete Santa Helena
,
[
9
]
[
7
]
[
1
]
foi dissolvida violentamente pela
policia politica
. Todos os participantes foram presos e posteriormente soltos, menos a judia Genny Gleizer ? sendo ainda menor de idade com dezessete anos ?, por supostas atividades subversivas.
[
6
]
[
3
]
[
7
]
[
4
]
Seu paradeiro permanecia um misterio, assim seu pai liderou uma busca em
jornais
e
revistas
com a frase: "Onde esta Genny?" e apesar das suas indagacoes e da sociedade, a policia insistia em negar a sua prisao. Aquela altura, Motel Gleizer peregrinava atras de autoridades e
advogados
que pudessem indicar o paradeiro da filha,
[
7
]
e a policia politica, que desobedecendo um
habeas corpus
impetrado a favor de Genny, escondeu a jovem da justica e da imprensa a transferindo de prisao em prisao, entre
Sao Paulo
e
Rio de Janeiro
, para despistar o publico e evitar os
processos
visando a solta-la ate que a ordem de expulsao do pais fosse outorgada e cumprida.
[
9
]
[
6
]
[
3
]
[
4
]
[
7
]
Mas em 18 de agosto de 1935, o jornalista Danton Gomes do
Correio Popular
descobriu que Genny estava presa numa das celas da
cadeia publica
de
Campinas
e conseguiu fazer a primeira
entrevista
com ela: ? "Ah! o senhor e reporter? Entao me faca a caridade de dizer que estou presa aqui. Hoje estive lendo nos jornais que todos me procuram, mas ignoram o meu paradeiro".
[
4
]
[
9
]
Dez dias apos Genny ter sido descoberta em Campinas, o delegado da ordem politica de Sao Paulo, Egas Botelho, afirmou em entrevista que ela teria sido solta e estava desaparecida. No entanto, a jovem ja havia sido transferida para a
Central de Policia do Rio de Janeiro
numa operacao sigilosa e logo retornaria a Sao Paulo. Nesse curto periodo de tempo, ela estivera em oito
cativeiros
diferentes sofrendo todo tipo de
intimidacao
e
maus-tratos
,
[
4
]
[
9
]
nem o proprio pai conseguia ve-la.
[
4
]
A pressao popular aumentou quando o governo decidiu deporta-la para a Romenia, pais alinhado com os ideais fascistas e antissemitas.
[
7
]
Seu drama ficou conhecido na epoca como o
Caso Genny Gleizer
.
[
5
]
Abaixo-assinados de intelectuais e de associacoes foram encaminhados a policia em defesa dos direitos de cidadania da jovem,
[
6
]
iniciando uma grande campanha pela sua libertacao, onde jornais
antifascistas
davam materias defendendo sua liberdade e atos publicos foram realizados, causando grande comocao no pais.
[
7
]
[
6
]
[
4
]
Inumeros jovens se ofereceram para
casar
com Genny para salva-la da expulsao, pois estrangeiras casadas com brasileiros, nao podiam ser deportadas. Entre eles estaria
Paulo Emilio Sales Gomes
, futuro
critico de cinema
.
[
6
]
[
4
]
Nesse cenario, diante da comprovacao de sua prisao, as autoridades deram suas primeiras versoes sobre o caso e os orgaos de repressao e setores conservadores da imprensa buscaram apresenta-la como uma "perigosa agente do comunismo internacional"
[
4
]
[
3
]
[
6
]
e que as provas apreendidas a incriminavam. No prontuario policial de Genny, lhe foram atribuidos
dezenove anos de idade
[
7
]
e continha "provas de suas ideias e comportamentos subversivos" sendo testemunhos de seu
status
de “estrangeira indesejavel”, demonstrando a preocupacao da policia politica em deixar claramente registrada tambem nos pronunciamentos junto a grande imprensa sensacionalista a sua identidade judaica ? a tratando com extremo
preconceito
, e a sua periculosidade ? por tambem ser uma mulher jovem e "comunista".
[
6
]
Mas de acordo com o
sociologo
Tulio Khan, as acusacoes feitas pela policia politica nao procediam, pois nada da atuacao da jovem junto ao
Partido Comunista Brasileiro
(PCB) e tampouco os documentos reunidos pelo
Departamento de Ordem Politica e Social
(DOPS) para incrimina-la, comprovaram que ela fosse pertencente a organizacao.
[
5
]
[
1
]
A relevancia dada pela policia ao papel dela junto ao PCB, era uma tentativa de conter as manifestacoes favoraveis a sua libertacao.
[
7
]
No
carcere
, a jovem sofreu violencias
fisicas
,
sexuais
e
psicologicas
.
[
7
]
Depois de tres meses de prisao, as vesperas da expulsao, o
jornalista
de
A Platea
, Arthur Piccinini, se
casa por procuracao
com Genny, mas essa ultima tentativa de rete-la em territorio brasileiro foi em vao e ela e
deportada
na madrugada de 12 de outubro de 1935 via
Porto de Santos
no
cargueiro
frances
Aurigny
para ser entregue ao
governo fascista
da
Romenia
,
[
7
]
[
6
]
condicao que significaria
pena de morte
.
[
2
]
O entao presidente
Getulio Vargas
ja havia assinado a resolucao determinando a expulsao da menor do territorio nacional em 21 de agosto de 1935, por ser considerada "elemento perigoso a ordem publica e nociva aos interesses do pais", ? uma expressao de mentalidade
fascista
?
[
6
]
[
4
]
[
7
]
[
3
]
e portanto, antes da realizacao do casamento com Piccinini, sendo que o mesmo permaneceu casado com Genny por mais onze anos, separando-se legalmente dela apenas em 1946.
[
7
]
Porem, gracas a intervencao do capitao e da tripulacao do navio que a conduziam e dos portuarios franceses, Genny pode ser resgatada por membros do
Socorro Vermelho Internacional
quando aportaram na
Franca
, dando-lhe a liberdade e um local onde se abrigasse em
Paris
.
[
3
]
[
1
]
[
4
]
[
7
]
Posteriormente, viveu na
Russia
e no
Peru
. Apos a
Segunda Guerra Mundial
, teria conseguido emigrar e se estabelecer nos
Estados Unidos
, morando em
Nova York
, onde formou-se em
psicologia
, trabalhando em um hospital e vivendo
reclusa
.
[
1
]
[
6
]
[
2
]
Teve uma filha chamada Renee Simoza, ja falecida.
[
10
]
Genny faleceu de causas naturais em 1995.
[
1
]
[
4
]
[
7
]
“
|
Se voce quiser acreditar em mim, acredite. Fui a primeira vitima do fascismo [no Brasil]!
|
”
|
? Jenny em entrevista,
[
2
]
|
Em
entrevista
a pesquisadora
Eva Alterman Blay
realizada em 23 de agosto de 1982,
[
2
]
ja com o nome de Jenny Simoza,
[
10
]
ela explicou que nao tinha nada a ver com politica, que foi vitima do acaso. Como eram so ela, o pai e a irma muito pequena, trabalhava, mas queria muito estudar e com esse pensamento foi se encontrar com um rapaz que a ajudaria. Como ele nao apareceu e havia uma reuniao em um salao proximo, entrou para procura-lo, quando de repente fecharam as portas e prenderam todos que la se encontravam. Mesmo tentando explicar que nao tinha culpa, foi presa e jogada em um porao junto com
prostitutas
e depois com
assassinos
.
[
2
]
Ficou incomunicavel por muito tempo, sofrendo
torturas fisicas
e
psicologicas
, ate ser deportada.
[
7
]
Seu caso serviu como modelo para as futuras acoes repressivas do governo Vargas,
[
4
]
a partir da reestruturacao da policia politica, que passava a agir baseada na recem promulgada
Lei de Seguranca Nacional
de 1935, suprimindo cada vez mais os espacos possiveis de contestacao da ordem vigente.
[
1
]
Tres meses depois da expulsao de Genny, no inicio de 1936 ? auge da
repressao
aos imigrantes no Brasil ?, a
policia politica
invade um
centro cultural
de trabalhadores judeus onde funcionava a
redacao
do
semanario
Der Unhoib
(O Comeco), buscando e prendendo os estrangeiros que la se encontravam, sendo a maioria deportada juntamente com seu pai a bordo do navio
Bage
em 16 de abril de 1936.
[
4
]
[
1
]
Assim como Genny, Motel Gleizer teria sido resgatado na Franca junto a outros imigrantes expulsos do pais
[
1
]
e posteriormente, foi morto em um
campo de concentracao
.
[
4
]
Sua irma
Berta
ficou
orfa
e sozinha no pais, entao passou a ser cuidada por familias de imigrantes judeus entre o Rio de Janeiro e Sao Paulo, sob a
tutela
do
Partido Comunista Brasileiro
, se casando posteriormente com o jovem
antropologo
Darcy Ribeiro
em 1948.
[
1
]
Genny voltou a ve-la algumas vezes anos mais tarde e sempre lhe escrevia cartas.
[
2
]
[
10
]
Gleizer foi posteriormente alcada a heroina das classes populares e como exemplo para os jovens estudantes no pais.
[
1
]
Apos sua deportacao, no dia 4 de novembro de 1935, foi noticiada a mobilizacao de jovens do
Para
para a
Campanha dos 50%
, que pleiteava a reducao dos custos de transporte e entretenimento para os estudantes. Na ocasiao, seu nome foi lembrado, como o de uma "autentica heroina da juventude brasileira".
[
1
]
Ja em 11 de novembro de 1935, foi noticiado pelo jornal
A Manha
que os trabalhos para a instalacao do
1º Congresso da Juventude em
Minas Gerais
haviam sido reiniciados e que sua delegacao, adotara o nome de Genny Gleizer em homenagem a jovem judia.
[
1
]
O
Caso Genny Gleizer
, foi precursor das campanhas pelos
direitos humanos
no Brasil, pois pela primeira vez no pais, registrou-se o envolvimento da sociedade civil em prol da libertacao de um
preso politico
e em nome dos direitos do cidadao.
[
5
]
[
6
]
[
1
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