Sobre a Verdade e Mentiras em um Sentido Nao-Moral
(em
alemao
:
Uber Wahrheit und Luge im aussermoralischen Sinne
, tambem chamado de
Verdade e Mentira em um Sentido Extra-Moral
)
e um ensaio
filosofico
por
Friedrich Nietzsche
. Foi escrito em 1873, um ano depois de
O Nascimento da Tragedia no Espirito da Musica
,
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mas foi publicado por sua irma
Elisabeth
em 1896, quando Nietzsche ja estava mentalmente doente. O trabalho lida amplamente com questoes
epistemologicas
sobre a natureza da
verdade
,
linguagem
e
ciencia
, e como elas se relacionam com a formacao de
conceitos
e, evidentemente, da
moral
.
O ensaio de Nietzsche e separado em duas partes. A primeira trata da concepcao e uso da linguagem, a segunda segue o mesmo tema, mas dessa vez tomando a ciencia como a herdeira da linguagem no que concerne a fabricacao e articulacao de conceitos, agora com maior complexidade. O texto, portanto, fornece uma explicacao (logo, uma critica) das consideracoes contemporaneas de
Verdade
e
conceitos
.
Essas consideracoes, argumenta Nietzsche, surgiram a partir do proprio estabelecimento da
linguagem
:
"
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Toda palavra imediatamente se torna um conceito, na medida em que nao se destina a servir como um lembrete da experiencia original unica e totalmente individualizada a qual deve seu nascimento, mas deve, ao mesmo tempo, encaixar-se em inumeros casos mais ou menos semelhantes?o que significa, estritamente falando, nunca igual?em outras palavras, muitos casos desiguais.
Todo conceito se origina por meio de equacionarmos o que e desigual.
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De acordo com Paul F. Glenn, Nietzsche esta argumentando que "conceitos sao metaforas que nao correspondem a realidade."
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Embora todos os conceitos sejam
metaforas
inventados por seres humanos (criados de comum acordo para facilitar a comodidade da comunicacao), escreve Nietzsche, os seres humanos esquecem esses fatos depois de inventa-los e passam a acreditar que sao "verdadeiros" e correspondem a
realidade
.
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Assim, Nietzsche argumenta que "verdade" e, na verdade:
"
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Um exercito movel de metaforas, metonimias e antropomorfismos—em suma, uma soma de relacoes humanas que foram aprimoradas, transpostas e embelezadas poeticamente e retoricamente, e que apos longo uso parecem firmes, canonicas e obrigatorias para um povo: verdades sao ilusoes sobre as quais se esqueceu que e isso que elas sao; metaforas que estao gastas e sem poder sensual; moedas que perderam suas impressoes e agora importam apenas como metal, nao mais como moedas.
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Durante a segunda parte do ensaio, Nietzsche argumenta que a ciencia parte de onde a linguagem parou, relativamente ao tecer de conceitos.
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Esse seria um processo necessario para que o ser humano consiga sobreviver, afinal, o
conhecimento
e a sua maior ferramenta.
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Contudo, elogia a
cultura grega
por lidar com a natureza de forma mais metaforica. O espirito artistico grego foi possivel, de acordo com Nietzsche, porque o "homem intuitivo" possuia maior apreco social em relacao a sua contrapartida, o "homem da razao".
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Vale lembrar que este ensaio foi ditado por Nietzsche ao seu amigo Carl von Gersdorff um ano apos a publicacao de
O Nascimento da Tragedia
, livro em que Nietzsche similarmente elogia a
cultura tragica grega
. Assim, vivendo com menor compromisso a Verdade da razao, o "homem intuitivo" era mais artisticamente rico, portanto, e nessa mesma medida, possuia maior liberdade. Mas essa liberdade nao e de todo lucro, pois o "homem intuitivo", quando sofre, sofre com maior intensidade, por nao ter aprendido com a experiencia, ao passo que o "homem da razao"
estoicamente
averte-se aos infortunios da vida, ou, se inevitaveis:
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Quando uma boa chuva cai sobre ele, ele se envolve com o seu manto e se distancia com passos lentos sob a chuva.
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Nesse sentido, o plano moral da verdade e o herdado historicamente, marcado pelo esquecimento das origens metaforicas da linguagem. Por isso, no campo moral, presume-se que a verdade e definitiva e inabalavel, e que os conceitos sao absolutamente precisos, em contraposicao as metaforas, incertas e relativas. Ja o extramoral e a renovada consciencia dessas origens estritamente relacionais da linguagem, ou seja, sua natureza descompromissada desde sua incepcao: a consciencia de que toda a linguagem teve origem metaforica.
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O segundo plano e extramoral por quebrar com o
idealismo
, visto que uma caracteristica amplamente conhecida deste e a ancoragem moral da verdade. Como aponta Sobrinho, Nietzsche parece escrever este ensaio como censura a
Critica da Razao Pura
, de
Immanuel Kant
, filosofo que fez parte do movimento
idealista alemao
.
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Essas ideias sobre a verdade e sua relacao com a linguagem humana tem sido particularmente influentes entre os teoricos
pos-modernos
,
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e "Sobre a Verdade e Mentiras em um Sentido Nao-Moral" e uma das obras mais responsaveis pela reputacao de Nietzsche (embora contenciosa) de "o padrinho do pos-modernismo."
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Referencias