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A Redencao de Cam

Origem: Wikipedia, a enciclopedia livre.
A Redencao de Cam
A Redencao de Cam
Autor Modesto Brocos
Data 1895
Tecnica tinta a oleo , tela
Dimensoes 199 centimetro x 166 centimetro
Localizacao Museu Nacional de Belas Artes

A Redencao de Cam e uma pintura a oleo sobre tela realizada pelo artista espanhol Modesto Brocos ( Santiago de Compostela , 9 de fevereiro de 1852 ? Rio de Janeiro , 28 de novembro de 1936 ), em 1895 . A obra aborda as teorias raciais controversas do fim do seculo XIX e o fenomeno da busca pelo "embranquecimento" gradual das geracoes de uma mesma familia por meio da miscigenacao . [ 1 ] A obra foi pintada enquanto Brocos lecionava na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. [ 2 ]

Atualmente, a pintura faz parte do acervo do Museu Nacional de Belas Artes , no Rio de Janeiro , presente na exposicao “Das Gales as Galerias: representacoes e protagonismos do negro no acervo do MNBA”, que busca proporcionar um olhar sobre as representacoes e protagonismos da populacao negra em 80 obras presentes no acervo do museu. [ 3 ]

Descricao e analise da pintura [ editar | editar codigo-fonte ]

A pintura A Redencao de Cam e fruto de um momento de pos-emancipacao , [ 4 ] marcado pela adesao do racialismo na esfera publica e da "necessidade" de acoes em relacao ao destino da populacao negra e miscigenada na ordem livre e republicana . [ 5 ] A obra faz alusao ao primeiro livro da Biblia Crista , Genesis , capitulo 9. No episodio, Cam expoe a nudez e bebedeira de seu pai, Noe , aos irmaos Sem e Jafe e, por isso, e condenado pelo pai a ser escravo juntamente com seu filho Canaa , [ 4 ] que e amaldicoado como "servo dos servos". [ 6 ] Noe profetizou que ele, Cam, seria "o ultimo dos escravos de seus irmaos". Cam e apontado na Biblia como suposto ascendente das racas africanas. [ 6 ] Diante disso, nos seculos XVI, XVII e XVIII, os cristaos usaram a passagem biblica para justificar a escravidao nas economias coloniais. [ 7 ]

O mapa estilizado "T e O", considerado o mapa impresso mais antigo do ocidente, faz alusao a Africa sendo dos descendentes de Cam.

A tela mostra uma especie de caminho para reverter a "maldicao" (ser afro-descendente), branqueando os personagens. [ 1 ] E perceptivel o naturalismo [ 1 ] presente na obra, que traz gradacoes de cores entre as tres geracoes dos personagens. O bebe e o mais branco, seguido pelo pai, sentado ao lado da mae, que segura a crianca no colo. No canto esquerdo da tela, quem tem a pele mais escura e a avo, com maos erguidas ao ceu em agradecimento. [ 8 ] Por nascer branco, seu neto foi livrado da "maldicao" de ser negro, ja que sua filha, mulata, casou-se com um homem branco. [ 8 ]

Sentados estao a mae da crianca, que a carrega em cima dos joelhos, e um homem com as pernas cruzadas, supostamente o marido branco e responsavel pelo "branqueamento" do descendente. Podemos notar que essa gradacao de cor segue da esquerda para a direita, mostrando a mesticagem em seu processo completo. Aqui, nao se trata apenas de uma eliminacao cultural e racial, mas tambem da necessidade de um progresso que, aos olhos de Brocos, so viria por meio do branqueamento da populacao e da aproximacao com a cultura europeia, eliminando e ignorando as demais etnias e costumes. [ 9 ]

Essa negacao da cultura africana fica aparente quando reparamos nas vestes das personagens femininas; ja que ambas usam roupas ocidentalizadas e nao trajes que remetem a origem das mesmas. [ 1 ] O corpo da mulher sentada esta coberto por roupas, fazendo com que pareca mais europeu do que africano. [ 1 ] Aqui, esta presente uma ideia de ajustamento das mulheres negras a moral crista e a um ideal de reproducao branqueador. [ 1 ] Alem disso, e notorio que as duas personagens que nao possuem a pele branca, sao mulheres: a mae e a avo, estabelecendo uma oposicao de cor em relacao ao bebe e o pai. [ 9 ] Ha um reforco da visao progressista da pele branca quando percebemos que o chao em que o homem pisa e de pedra, mostrando uma evolucao em relacao ao que as mulheres pisam, que e de terra. [ 9 ] Mais uma vez, o europeu de pele branca e representado como superior, e isso fica explicito ate na pose em que o homem, de costas, olha o resto da cena. [ 9 ]

A posicao das maos e olhares entre os personagens trazem coerencia a mensagem que Modesto Brocos quis passar. A obra lhe rendeu a medalha de ouro no Salao Nacional de Belas Artes de 1895 e mostra os rumos da arte brasileira no final do seculo XIX . [ 6 ]

Existe a teoria de que a mae (sentada, ao centro da tela) seria a representacao da Virgem Maria e o bebe, o menino Jesus . [ 4 ] Isso se deve gracas a cor azul do xale em que esta envolta, pois faz alusao ao manto usado pela Virgem Maria . [ 4 ]

Branqueamento e eugenismo no Brasil [ editar | editar codigo-fonte ]

No seculo XIX , difundiu-se no Brasil a ideia de “branqueamento” da sociedade, que pretendia apagar os tracos negros da populacao brasileira . [ 10 ] Durante as primeiras decadas do seculo XX , a industrializacao , imigracao e urbanizacao trouxe uma visao mais pessimista e de nacionalismo ao pais. As duas guerras mundiais trouxeram a expansao do nacionalismo, aliando a ideia de raca a construcao das nacionalidades. [ 11 ]

Francis Galton, responsavel por disseminar o ideal eugenistico.

Na Europa, o ideal eugenico foi disseminado pelo ingles Francis Galton ( Birmingham , 16 de fevereiro de 1822 ? Haslemere, Surrey , 17 de janeiro de 1911 ) em 1883 . Primo de Charles Darwin , afirmava que a selecao natural tambem era valida aos seres humanos. Sua crenca era de que a capacidade intelectual nao e individual, e sim hereditaria . [ 12 ] Seu projeto analisou a arvore genealogica de aproximadamente 9 mil familias e tentava justificar a exclusao de diversos grupos: deficientes , negros , asiaticos e todos que nao se encaixavam no suposto "padrao europeu". [ 13 ] Esse padrao era baseado na tese de que o europeu era o detentor da maior beleza, competencia civilizacional e saude quando comparado as "demais racas", como a negra (africana), a "vermelha" (indigena) e “amarela” (asiatica). [ 14 ]

Os primeiros tracos do eugenismo no Brasil apareceram no final da primeira decada do seculo XIX. Em 1917 , o medico e farmaceutico Renato Kehl , foi o responsavel por ampliar e disseminar o eugenismo no Brasil . [ 13 ] Kehl acreditava que a unica forma do pais prosperar era com um projeto que focasse no predominio da raca branca, prezando pelo branqueamento da populacao negra. [ 12 ] Alem da segregacao pela cor da pele, seu discurso tambem apoiava a exclusao de deficientes (sejam eles fisicos ou mentais) da sociedade. [ 13 ] Defendia a esterilizacao de criminosos, regulamentacao de um exame pre-nupcial (para garantir que a noiva era virgem), exames que assegurassem o divorcio caso a mulher tivesse "filhos ilegitimos" ou fosse comprovado defeitos hereditarios em sua familia, educacao eugenica obrigatoria nas escolas e teste para medir a capacidade mental em criancas de 8 a 14 anos. Kehl apresentou seus pensamentos em diversos congressos, e teve impacto em grupos de professores , medicos e adeptos do higienismo social . Assim, foi fundada, em 1918 , a primeira sociedade eugenica da America latina, a Sociedade Eugenica de Sao Paulo (SESP). Alguns nomes conhecidos faziam parte do grupo. [ 13 ]

Nos anos subsequentes, a eugenia despertou o interesse dessa elite brasileira, que criou o estigma do "homem brasileiro", excluindo todos os que nao se encaixavam no que era idealizado por eles. Havia a crenca de que o movimento promoveria uma reforma nos valores esteticos, higienicos e morais da sociedade brasileira. Na epoca, o ideal trouxe a tona uma sociedade ainda mais patriarcal. [ 13 ] Aqui, cabia as mulheres o simples papel de "procriar" e realizar as tarefas domesticas atribuidas por seu marido. [ 12 ] A " identidade nacional " transpassava limites e trazia a tona o racismo presente nas camadas mais altas da sociedade brasileira. [ 16 ]

Brocos e o apoio ao eugenismo [ editar | editar codigo-fonte ]

Autorretrato de Modesto Brocos, pintor de A Redencao de Cam .

Modesto Brocos nunca negou seu apoio as teorias eugenistas. Em 1930, trinta e cinco anos depois de pintar A Redencao de Cam , o artista lancou o livro Viaje a Marte (em portugues, "Viagem a Marte"), uma ficcao cientifica. Nela, o pintor aparece como um personagem que narra sua visita em um planeta em que ha politica de reproducao controlada por meio de agentes do estado - o Exercito Agricola e as Irmas Humanitarias - todos voluntarios e brancos. Mesmo sendo um livro de ficcao, Brocos deixa explicito seus ideias eugenistas e racistas [ 17 ] quando, em um dos trechos da obra, diz que a humanidade nao estava satisfeita, pois ainda deveria haver uma "unificacao de racas". [ 18 ] Ele completa dizendo que em tempos anteriores, com a raca "amarela", a mesticagem havia sido mais facil, mas que com a raca negra, apesar de ter havido o mesmo processo, a cor "apresentou dificuldades de ser miscigenada". [ 18 ]

Simbolo eugenista [ editar | editar codigo-fonte ]

Joao Batista de Lacerda, medico , cientista brasileiro e um dos principais expoentes da "tese do embranquecimento ".

A obra e considerada uma das pinturas mais racistas e reacionarias do seculo XIX, trazendo consigo o simbolismo do pensamento elitista. A pintura aparece num processo pos-abolicionista da nova republica, que buscava pelo progresso usando a Europa como modelo. Aos olhos da elite, o branco, representava progresso, enquanto o negro, o atraso, passado. Nesse contexto surge o eugenismo e o branqueamento mencionado anteriormente, que propunha a miscigenacao como solucao, deixando a populacao com um perfil cada vez mais europeu. A pintura e simplesmente uma representacao visual do assunto presente no discurso dos "intelectuais" da epoca. [ 13 ]

Em 1911, o entao diretor do Museu Nacional do Rio de Janeiro , [ 5 ] Joao Batista de Lacerda ( Campos dos Goitacases , 12 de julho de 1846 ? Rio de Janeiro , 6 de agosto de 1915 ), usou A Redencao de Cam como ilustracao de seu artigo intitulado Sur les metis au Bresil (em portugues, "Sobre os Mesticos no Brasil") no I Congresso Universal das Racas, em Paris. [ 19 ] O Congresso reuniu intelectuais de todas as partes do mundo para debater a relacao das racas com o processo de civilizacao. A obra de Lacerda, considerado um dos principais expoentes da "tese do embranquecimento ", saia em defesa da miscigenacao, apresentando a positividade desse processo no Brasil e mostrando a suposta superioridade dos tracos brancos em relacao aos negros e indigenas. [ 20 ] Ao apresentar a pintura de Brocos, descreveu-a da seguinte maneira: “O negro passando a branco, na terceira geracao, por efeito do cruzamento de racas”. [ 13 ] Em seu discurso, afirmava que em cem anos a populacao brasileira seria majoritariamente branca; ou seja, em 2011/12 a populacao negra seria extinta e os mesticos representariam, no maximo, 3% da populacao. [ 1 ]

Entre as decadas de 1920 e 1930, ja nao era mais possivel haver um distanciamento entre brasileiros que se identificavam como europeus exilados e a populacao local, ja que a mistura entre povos indigenas, negros e brancos constituiram uma miscigenacao que saia dos padroes impostos pela alta sociedade branca. Assim, a elite tinha quase uma necessidade de criar uma nova identidade brasileira, com o desejo de ser diferente de qualquer modelo. Assim, o ideal eugenista perdeu muito de sua forca. [ 7 ]

Ver tambem [ editar | editar codigo-fonte ]

Referencias [ editar | editar codigo-fonte ]

  1. a b c d e f g h SANTOS, Ana Paula Medeiros Teixeira. ≪Trancas, Turbantes e Empoderamento de Mulheres Negras: Artefatos de Moda como Tecnologias de Genero e Raca no Evento Afrochic≫ (PDF) . UFTPR . Consultado em 23 de outubro de 2018  
  2. VASCONCELOS, Flavia Maria. ≪Sobre pinoquismos como estetica e politica e a sindrome do vira-lata criativo desde a educacao em artes visuais≫ . UNIVASF . Consultado em 3 de novembro de 2018  
  3. MUSEU Nacional de Belas Artes. ≪Mostra das Gales as galerias, no MNBA, reflete o papel do negro na arte≫ . Museu Nacional de Belas Artes . Consultado em 28 de outubro de 2018 . Arquivado do original em 28 de agosto de 2018  
  4. a b c d LOTIERZO, Tatiana; SCHWARCZ, Lilia. ≪Raca, genero e projeto branqueador : "a redencao de Cam", de modesto brocos≫ (PDF) . Catalago USP . Consultado em 23 de outubro de 2018  
  5. a b MOREIRA, Carlos Alberto; MARTINS, Edina Maria; SOUZA, Luiz; ALVEZ, Marilene; SILVA, Sabrina (2008). ≪Os Diretores do Museu Nacional / UFRJ≫ (PDF) . Museu Nacional | UFRJ . Consultado em 26 de novembro de 2018  
  6. a b c ENCICLOPEDIA Itau Cultural. ≪A Redencao de Cam≫ . Enciclopedia Itau Cultural . Consultado em 23 de outubro de 2018  
  7. a b CAVALCANTI, Ana Maria Tavares (25 set. 2010). ≪Artistas brasileiros entre territorios: A relacao com a Europa e o sentimento de exilio a propria patria no seculo XIX≫ (PDF) . Anais do 19º Encontro da Associacao Nacional de Pesquisadores em Artes Plasticas “Entre Territorios” . Consultado em 19 de novembro de 2018  
  8. a b SOUZA, Ellen Pereira. ≪Estudos sobre a formacao de professores de ciencias no contexto da lei 10.639/03≫ (PDF) . Universidade Federal de Goias . Consultado em 3 de novembro de 2018  
  9. a b c d MORAES, Renan Siqueira. ≪Quadro de Epoca. Uma Alegoria Sobre a Miscigenacao no Conto "Uma Escrava", de Magalhaes de Azeredo≫ . Revista Dia-logos, v. 10, n. 02, p.62-69, jul.-dez. 2016 . Consultado em 18 de novembro de 2018  
  10. CRUZ, Vera Lucia Dal Santos. ≪Refletindo sobre Genero e Etnia no Ensino de Historia≫ (PDF) . Dia a Dia Educacao PR . Consultado em 29 de outubro de 2018  
  11. SOUZA, Vanderlei Sebastiao. ≪As Ideias engenicas no Brail: ciencia, raca e projeto nacional no entreguerras≫ . Historia em Reflexao . Consultado em 29 de outubro de 2018  
  12. a b c d FERREIRA, Tiago. ≪O que foi o movimento de eugenia no Brasil: tao absurdo que e dificil acreditar≫ . Geledes.org . Consultado em 29 de outubro de 2018  
  13. a b c d e f g h i RONCOLATO, Murilo. ≪A tela 'A Redencao de Cam'. E a tese do branqueamento no Brasil≫ . Jornal Nexo . Consultado em 3 de novembro de 2018  
  14. FERNANDES, Claudio. ≪Tese do branqueamento: A tese do branqueamento teve grande repercussao no Brasil, no inicio do seculo XX, entre intelectuais, como Joao Baptista de Lacerda≫ . Mundo Educacao . Consultado em 19 de novembro de 2018  
  15. STEPAN, Nancy Leys (2004). ≪Eugenia no Brasil, 1917-1940≫ (PDF) . Editora FIOCRUZ . Consultado em 21 de novembro de 2018  
  16. CAPEL, Heloisa; Junior, Geraldo. ≪Performances hibridas no pensamento utopico de Modesto Brocos y Gomez (1852-1936)≫ . Consultado em 19 de novembro de 2018  
  17. LOTIERZO, Tatiana. ≪Racismo e pintura no Brasil: notas para uma discussao sobre cor, a partir da tela A redencao de Cam≫ . Consultado em 19 de novembro de 2018  
  18. a b BROCOS, Modesto (1930). Viaje a Marte . Valencia: Editorial Letras y Artes. pp. (p. 182 ? 183)  
  19. LOTIERZO, Tatiana H.P. (2013). ≪Contornos do (in)visivel: A Redencao de Cam, racismo e estetica na pintura brasileira do ultimo Oitocentos≫ . FFLCH - USP . Consultado em 26 de novembro de 2018  
  20. CARVALHO, Andre; ALMADA, Abdias Nascimento; FISCHER, Machado de Assis; SANTOS, Theodoro Sampaio; TENORIO, Carolina Maria; SCHWARCZ, Lima Barreto; MUNANGA, Kabengele (18 dez. 2017). ≪O Brasil na potencia criadora dos negros: O necessario reconhecimento da memoria afrodescendente≫ (PDF) . Revista do Instituto Humanitas Unisinos, nº 517 . Consultado em 19 de novembro de 2018  

Bibliografia [ editar | editar codigo-fonte ]

  • BROCOS, Modesto. Viaje a Marte . Valencia: Ed. Arte y Letras, 1930.
  • LACERDA, Joao Baptista. Sur les metis au Bresil . Londres: Premier Congres Universel des Races, 1911.
  • STEPAN, Nancy Leys. A hora da eugenia: raca, genero e nacao na America Latina . Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2014.
  • SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetaculo das racas: cientistas, instituicoes e questao racial no Brasil - 1870-1930 . Sao Paulo: Companhia das Letras, 1993.